PALAVRA DE VIDA
Todos os dias... (Lc 19,45-48)
Em geral, nossos olhos se prendem ao espetacular. Até mesmo ao escandaloso. Aliás, este é o critério de nossos noticiários: as coisas comuns não dão notícia. A tela e as manchetes se ocupam do extraordinário.
No caso deste Evangelho, a notícia da TV daria destaque ao descontrole emocional do Rabi da Galileia. As câmeras iriam deter-se nas bancadas derrubadas ao solo, aos animais dispersos pelo pátio do Templo. Os comentaristas do dia seguinte iriam repercutir (o verbo da moda!) a reação indignada das autoridades religiosas.
E assim, com tudo isto, deixaríamos de prestar atenção a uma frase essencial para nós: “Jesus ficava ensinando no Templo todos os dias...” (Lc 19,47) Sim, TODOS OS DIAS. A atuação de Jesus de Nazaré como Mestre era uma ação de todos os dias. Todo aquele que passasse pelo pórtico de Salomão (cf. Jo 10,23), de segunda a segunda, iria ouvi-lo com seu convite à confiança no Pai, que alimenta os pardais e veste os lírios do campo, que faz chover sobre justos e injustos. Ficaria sabendo do filho fugido que voltou a casa do Pai e foi recebido com beijos e festas. Tomaria conhecimento de que um samaritano estrangeiro havia cuidado de um judeu ferido pelos assaltantes.
E isso, TODOS OS DIAS. Será que Jesus não se cansava? Será que não se deixava desanimar pela rotina. Será que ele não perdia a coragem diante da quadrilha mal intencionada dos escribas e fariseus que também ali compareciam, todos os dias, para estender-lhe suas arapucas?
Pois Jesus é o nosso exemplo de perseverança. Exemplo de continuidade. Ou, para usar um termo paulino, nosso exemplo de “hipomoné” (cf. Rm 2,7)– palavra que se costuma traduzir por paciência, perseverança, “endurance”, mas que designa uma condição da guerra, quando se combate com inferioridade de forças, mas não se desanima jamais.
Não nos deixemos iludir, porém! Ele não perdeu a paciência. Ao trocar as palavras de cada dia pelo chicote improvisado com cordas, Jesus de Nazaré continuava ensinando. É que existe a palavra profética, como Isaías junto ao Rei Acaz (cfIs 7,10), e existe o gesto profético, como o cinto escondido no rochedo (cf. Jr 13) ou o buraco na muralha (cf. Ez 12,5). Há momentos em que os ouvidos se tornam surdos à palavra sonora e é necessário abrir os olhos dos surdos com gestos espetaculares, de modo que eles já não possam justificar-se: “Eu não sabia...”
Estamos ouvindo o que o Senhor nos diz? Ou será necessário novo chicote de cordas?
Orai sem cessar:“Eis que estou convosco todos os dias...” (Mt 28,20)
Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
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